4 de março de 2010

PROGRAMA e NOTAS do PROGRAMA


VOZES ALFONSINAS

Cantares antigos: da Aquitânia ao Brasil

6 de Março de 2010

Susana Conde Teixeira, meio-soprano

Gonçalo Pinto Gonçalves, tenor e percussão

Sérgio Peixoto, tenor

Victor Gaspar, barítono

Madalena Cabral, rabeque

Pedro Sousa Silva, flautas de bisel

Nuno Torka Miranda, alaúde, vihuela e guitarra

Manuel Pedro Ferreira, direcção e apresentação

PROGRAMA

1ª parte

Cânticos religiosos dos séculos XII e XIII: Da Aquitânia a Compostela

Cânticos festivos para o dia de Natal:

Epístola de S. Paulo a Tito (para a Missa do Galo), com tropo Gaudeamus (Missal de Mateus)

Anónimo: Ad cantus leticie (discantus a 2 vozes, versão cisterciense)

Anónimo: Catholicorum concio (organum a 2 vozes):

versão aquitana, séc. XII

versão cisterciense de Hauterive, séc. XIII

versão cisterciense do mosteiro de Las Huelgas, séc. XIV

Cânticos para a Virgem Maria nos caminhos para Santiago:

Cantiga de Santa Maria nº 322 (Évora): «A virgen, que de Deus madre éste, Filla e criada»

Cantiga de Santa Maria nº 246 (Alcácer-do-Sal): «A que as portas do ceo abriu pera nos salvar»

Cânticos para Santiago:

Aymericus Picardi (c. 1150?): Ad honorem regis (conductus a 2 vozes, Códice calixtino, Santiago de Compostela)

Albertus Parisiensis (c. 1150): Congaudeant catholici (conductus a 3 vozes, Códice calixtino, Santiago de Compostela)

2ª Parte

Cantares de corte, cantares ao divino: Ferrara e Brasil

Canções do século XV no códice Porto 714 (excepto *)

Conrad Paumann: "Mit ganczem willen" (instr.)*

John Bedyngham: Mon seul plaisir

Guillaume Dufay: "J'ay mis mon cuer" (instr.)

Anónimo: Helas n'array ie jamais mieux

Anónimo: "A Florence/Ellas la fille" (instr.)*

Robertus de Anglia: O fallaze e ria fortuna

John Bedyngham: O rosa bella

Contrafacta de José de Anchieta, evangelizador do Brasil:

Anónimo (música)/ José de Anchieta (texto tupi): Ave Maria poránga

Anónimo (música)/ José de Anchieta (texto): “Ó que pão, ó que comida” (Do Santíssimo Sacramento)

Juan de Anchieta: Congratulamini mihi omnes (instr.)

Anónimo (música)/ José de Anchieta (texto): “Oh Dios infinito”

Anónimo (mús.)/ José de Anchieta (texto): “Mil suspiros dió Maria”

Paracumbé (instr.)

Anónimo /José de Anchieta (texto): "Venid a sospirar al verde prado/Venid a suspirar con Jesú amado"

NOTAS AO PROGRAMA

As Vozes Alfonsinas apresentam neste programa uma larga viagem através de repertórios musicais contrastantes: um deambular histórico (do século XII ao século XVI) e geográfico (do sul de França e do norte de Itália ao Brasil, passando pela Península Ibérica). De facto, a música circulou internacionalmente desde tempos recuados, sendo livremente adaptada aos novos contextos encontrados. Da Aquitânia medieval (sudoeste de França), será ouvida uma leitura para a Missa do Galo, tropada (ou seja, com acrescento poético-musical), na versão que chegou a Portugal através do Missal de Mateus (Vila Real). Também da Aquitânia houve peças a duas vozes que foram mais tarde adoptadas em mosteiros associados à Ordem cisterciense, como Las Huelgas (Burgos); no caso de Catholicorum concio, podemos seguir a trajectória da composição através de três versões que nos levam até ao início do século XIV. Um dos pólos de atracção da Cristandade medieval era Santiago de Compostela; teremos oportunidade de ouvir Cantigas a Santa Maria ligadas aos caminhos portugueses que, do sul, levavam a Compostela, e também composições polifónicas do norte de França que aí chegaram através do célebre Códice Calixtino. Na 2ª parte, a temática religiosa será provisoriamente posta de parte para se exemplificar a mistura de estilos (anglo-italiano e franco-flamengo) que ocorre num livro escrito em Ferrara no 3º quartel do século XV, hoje conservado no Porto; peças instrumentais da época complementam os excertos deste cancioneiro, famoso por incluir muitas peças de Guillaume Dufay e de compositores ingleses contemporâneos com ligações a Itália. À sofisticação elitista das cortes renascentistas sucedeu, c. 1500, um repertório polifónico mais acessível, com traços popularizantes, na qual muitos compositores ibéricos vazaram as suas reflexões amorosas. Um destes compositores foi Juan de Anchieta, também conhecido pelos seus motetes, dos quais Congratulamini mihi omnes, até há pouco inédito, foi publicado em Lisboa em 1540 na Arte de tanger de Gonçalo de Baena. Foi com base nesse corpus de cantigas e vilancetes amorosos que José de Anchieta, jesuíta originário das Ilhas Canárias, sobrinho de Juan de Anchieta, mas educado em Coimbra, e depois enviado para o Brasil, escreveu uma série de canções de temática religiosa, as quais, para maior eficácia pastoral, adoptavam os metros e a música de composições preexistentes. As suas letras eram em português, castelhano, ou tupi — já que o seu propósito evangelizador incluía a população índia que falava esta língua, da qual Anchieta se tornou o primeiro especialista e dicionarista europeu. As recriações dos seus contrafacta são baseadas no repertório que circulava em Portugal em meados do século XVI, época da sua formação em Coimbra, em especial as peças transcritas no Cancioneiro Masson. O Paracumbé, que se ouvirá entre as canções, é uma reconstituição de uma dança de influência africana, popular no Brasil por volta de 1600.

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